Exploração do pré-sal no Espírito Santo ameaça áreas preservadas de litoral e coloca em risco a cultura e sobrevivência das comunidades tradicionais, especialmente no norte capixaba.
Ao sul da costa do Espírito Santo, no município de Anchieta, o pescador da Comunidade de Ubu, Adilson Ramos Neves, de 57 anos, que aprendeu o ofício com o pai e o avô, mostra como o dourado se movimenta nas águas para responder por que os empreendimentos do pré-sal afetam a pesca em todo o litoral capixaba.
“O peixe faz o seguinte… faz isso, ele vai e volta na costa, não tem uma toquinha no mar e fica ali parado, sabe … você veja bem… o dourado não é brasileiro, mas todo ano vem pra nossa costa, todo ano passa aqui: um grupo entra ali na Barra do Riacho [norte do Estado], na beira do barranco, que a gente chama, e daí ele desce, vem descendo sempre na beira do barranco…”. Barranco, ele explica, são “as partes do mar de 90 a 100 metros de profundidade, daí para fora a gente chama de profundo”.
“Então quando termina seu tempo de descer, lá por janeiro, ele sobe … e a sísmica [método que utiliza descarga de ondas sonoras nas águas para sondar a presença do petróleo no mar] está modificando o rumo do dourado ir e voltar. Antes ele vinha até 40-46 metros de profundidade, o que ficaria em seis milhas da costa. Hoje já não vem mais. Vem na base de 90-100 metros de profundidade e quando volta, volta pelo profundo. Tá diminuindo e os que conseguem chegar aqui tão vindo cada vez mais pelo profundo. É muita sísmica, é muita água remexida. Então, quando se mexe no mar aqui [sul] eles sentem lá [norte] e quando mexe lá sentimos aqui”.
De norte a sul, o Espírito Santo vem passando por um processo de transformação e de mudança de territorialidade intensificado a partir da descoberta do petróleo e gás na camada do pré-sal, anunciada há menos de 10 anos, em 2006. Estado pequeno em relação a outras unidades da federação, é no litoral que concentra sua maior área – são 411 quilômetros de comprimento na costa e cerca de 200 quilômetros de largura em direção ao interior.
A extração comercial de petróleo e gás do pré-sal é feita desde 2010 na Bacia de Campos, ao sul do Estado, no chamado Parque das Baleias, que engloba os campos Baleia Azul, Jubarte e Baleia Franca, com operação exclusiva da Petrobras, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustível (ANP). Mas as mudanças trazidas pela exploração a grande profundidade (chega a 7 mil metros) no oceano afetam todo o território capixaba, uma vez que a extração de petróleo e gás gera uma extensa cadeia de produção e necessita de uma infraestrutura complexa – industrial, ferroviária, rodoviária, portuária.
“Para abastecer o boom petroleiro atual, suas plataformas, navios, dutos, instalações, alavanca-se em larga escala a mineração e a siderurgia, por exemplo. Bem como os setores de logística, naval, além dos complexos portuários, ferroviários e rodoviários. Cria-se uma rede de empreendimentos tanto no mar quanto em terra. E isso vem acontecendo em todo o território do Espírito Santo”, explica o professor e coordenador do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Cláudio Zanotelli.
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